sexta-feira, 18 de setembro de 2015

O francesismo pelotense

(parte 2/2)


                                                                                              A.F. Monquelat

 
  
          Sendo o cavalheiro um apreciador dos bons petiscos tinha a escolha de apreciá-los no Restaurant Francez, junto à ponte metálica do São Gonçalo, que dispunha de um serviço À la minute.

         Ao restaurante se chegava através dos três quão chics escaleres denominados Ideal, Bela Aurora e Republicano, ancorados no local denominado Laranjeiras e, caso se fizesse acompanhar pela família, haveria maior modicidade nos preços.

         O cardápio? Aliás, o “Menu”? Bem, o cavalheiro poderia pedir um “Poulet aux petit-pois jambom” e madame, quem sabe “Bifteech aux champignons” ? Oui? Então que seja.

         O restaurante ao qual nos referimos, acreditamos não tenha sido bem sucedido: ou os pratos não foram, quando servidos, do agrado da clientela pelotense ou pode ter sido pelo local, distante e não muito afrancesado; pois, em julho de 1884, estava à venda podendo os interessados em comprá-lo se dirigirem ao próprio local ou tratarem, “na cidade”, com Joaquim José Dias Ferreira, Rua General Vitorino [atual Anchieta] nº 168.

         O restaurante possuía um fogão de ferro superior e tudo o mais que era preciso haver em “um estabelecimento desta ordem”.

         Considerando a hipótese do Sr. Joaquim Dias Ferreira ser o proprietário do Restaurante, e de origem portuguesa, o que é bem provável, vemos então quão importante era o ser francês, naquela época, em Pelotas, aliás, ser ou parecer francês era importante, de bom tom e necessário em quase todos os lugares do mundo, pois, o idioma francês era o idioma mais influente, pelo menos no mundo ocidental.

 
         Agora, quisesse o cavalheiro uma novidade e fosse amante de qualquer qualidade de bebidas, como cerveja, licores, etc., etc., etc., e também doces diversos, etc., desse um pulo ao novo estabelecimento denominado Cassino Parisiense, situado à Rua General Vitorino [atual Anchieta] esquina Voluntários, que encontraria um serviço feito verdadeiramente à parisiense por duas senhoras recém-chegadas de Montevidéu, que garantiam o ameno trato e a excelente qualidade das bebidas; era, pois, um recreio agradável oferecido ao respeitável público, que de certo não deixaria de afluir àquele novo estabelecimento, completa novidade em Pelotas.

         Já por sua vez o Sr. Henri Bensa, francês que havia trabalhado nas principais cidades da Europa, bem como no Rio de Janeiro e Montevidéu, dispondo, portanto de uma longa prática, afiançava ao público pelotense que poderia satisfazer qualquer gosto, por mais “esquisito” que fosse em seu estabelecimento,  Colchoaria de Pariz, que estava reaberta (onde fora o comércio dos Srs. J. M. Ribas & Cia.) à Rua São Miguel [atual 15 de Novembro] nº 89, local onde o público pelotense encontraria os serviços de “colchoaria, estofador e armador”, trabalho à capricho, completo sortimento e modicidade em preços.

         Quanto ao Sr. Eduardo Jeanneret, proprietário da “Óptica” localizada à Rua São Miguel [atual 15 de Novembro] nº 153, fazia ciente que comprara do Sr. Leopoldo Leon seu completo “sortimento de objetos de óptica” bem como informava ter à disposição do respeitável público telescópios, microscópios, lentes de óculos de alcance, binóculos para teatro e campanha [zona rural], óculos e pince-nez de ouro, prata dourada, prata, tartaruga e aço. Vidros brancos e de cores de todos os graus, barômetros e termômetros para parede e banhos.

         Na óptica do Sr. Eduardo eram feitos ainda os mais diversos consertos.

         Salientamos também que o relógio da Torre do Mercado foi adquirido pelo município de Pelotas através da empresa do Sr. Jeanneret.

         E aproveitando a caminhada pela Rua São Miguel, essa do Café Aquário, demos uma parada na loja dos Srs. Mascarenhas & Barcellos, que anunciaram terem “altas novidades!”: Cortes de vestidos. O que tem aparecido de mais chique neste gênero, tecidos os mais modernos, recém-chegados de Paris. Para os meninos os Srs. Mascarenhas &Barcellos haviam recebido não somente sobretudos franceses, muito baratos, bem como trajes de casimira para todos os preços, calçados superiores para o inverno e meias de lã, muito finas.

         Em caso de festa para ir, e precisando de artigos direto de Paris, sem precisar ir a Paris, era só dar uma chegadinha no “Paraizo das Damas”, que acabara de receber um lindíssimo sortimento de sedas para vestidos e enfeites, cores as mais modernas assim como: rendas finas de diversas qualidades; rendas com vidrilhos; filó de seda, branco e preto, bordados a vidrilhos; sapatos de cetim, em diversas cores e pretos, e muitos outros. Luvas de cores escolhidas, muito modernas. Leques? Também recebera o “Paraizo das Damas” e o que “pode se apresentar demais chic”, informavam os comerciantes.

         Permito-me agora uma pergunta: haveria necessidade de ir a Paris para se sentir um parisiense em Pelotas?

         Enquanto você pensa a respeito, daremos uma olhada no comunicado que a viúva Celestina Bardou fazia ao comércio: “A Viúva Bardou participa ao comércio e a todos os seus fregueses da cidade e da campanha, que a fábrica de seges do finado Furtuné Bardou seu marido, sucessor de Carlos Ruelle”, continuava a operar sob a direção do “antigo e inteligente contramestre Pedro Tapier”.

         No comunicado, a Sra. Bardou dizia esperar continuando a merecer a confiança “que há tanto tempo esta população e a da campanha” tinham dispensado a seu pai e marido.

         Furtuné Bardou, 45 anos de idade, sucessor de seu sogro Carlos Ruelle, ambos artesãos franceses e desde há muito radicados em Pelotas, foi enterrado no cemitério da cidade.
                                        
         Agora, depois de todo esse passeio por essa Pelotas parisiense, que achamos ter lhe mostrado, você ainda achar que foram buscar em Paris os motivos para o surgimento da lenda urbana, nos resta dizer-lhe que embora não pareça haver diferença entre o dizer que Pelotas não foi a Paris, e sim que Paris veio a Pelotas, existe sim e é importante entendê-la.Se não, vejamos: quando é dito que Pelotas foi a Paris, fica-nos a impressão de que o fez por iniciativa própria e com o intuito de se modernizar, não somente agregando conhecimentos novos, em todos os sentidos e áreas, mas, e também, evidenciar o poder econômico de certa classe social.

         Enquanto pensamos a respeito, convidamos o leitor a, juntamente com a enorme colônia francesa se reunir no local situado à Rua Sete de Setembro a fim de deliberar sobre a maneira de comemorar a festa nacional do 14 de Julho [Queda da Bastilha], bastando tratar nos endereços dos Srs. J. Perez, C. Serres, Augusto. Blandin, L. Broqua e Monsieur C. Tarnac.

         A comissão encarregada de organizar a festa teve como Presidente o Sr. Bonelli; vogais os Srs. Dominique Pineau, Augusto Blandin, Ramain Prieux, Adrian Behocaray e Lescure.

          E assim foi que, dia 14 de julho de 1884 a importante colônia francesa de Pelotas, composta dos “mais distintos cavalheiros” celebrou a tomada da Bastilha, dando um grande jantar no Hotel Londres [o Hotel e Restaurant de Londres, de propriedade de Bertrand Bascou & Cie., estava situado à Rua Andrade Neves nº 130] .

         Segundo a imprensa da época, durante o dia (14) estiveram embandeiradas algumas casas de residência e os navios atracados no porto da cidade.








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Fonte: acervo da Bibliotheca Pùblica Pelotense e livro Mercado Central - Pelotas- de Klécio Santos

Ilustrações: acervo da Bibliotheca Pública Pelotense
Revisão do texto: Professor Jonas Tenfen
Tratamento de imagens: Bruna Detoni

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