quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Os alemães e teuto-brasileiros na indústria pelotense do século XIX

             A fábrica de línguas do Sr. Henrique Blethmuller                               


                                                                                     A.F.Monquelat


         A fábrica de línguas do Sr. Henrique Blethmuller, uma das três estabelecidas em Pelotas na década de 80 do século XIX, estava instalada à Rua São Miguel [atual 15de Novembro] nº 265. 
        Para o preparo das línguas era realizado o seguinte processo: logo que as línguas chegavam das charqueadas, eram colocadas, em número de trinta (30), dentro de uma caldeira de cobre para depois pelarem.
         Depois disto, eram colocadas sobre algumas mesas e ali, com facas apropriadas, eram peladas e aparadas para ficarem bonitas à vista.

         Em seguida, eram salgadas e logo depois passavam para as prensas. Eram três caixotes de madeira comportando cada um a média de mil línguas.

         Ali ficavam por dois ou três dias; sendo, então, passadas para as pipas de salmoura onde permaneciam de seis a quatorze dias.
         O estabelecimento possuía 25 pipas destinadas à salmoura.

         Em seguida à salmoura, iam as línguas para o varal, que podia comportar quatro mil línguas, e ali ficavam a secar; sendo por último levados para o fumeiro, uma estufa onde cabiam oitocentas línguas, que ficavam sofrendo a ação da fumaça de lenha de goiabeira.
         Dali eram as línguas retiradas para cinco barricas grandes, onde ficavam depositadas até serem postas nos recipientes próprios para o despacho: barricas menores que comportavam duzentas e trinta línguas.

         Neste estabelecimento industrial, trabalhavam cinco pessoas.
         O Sr. Henrique era natural da Alemanha e estava estabelecido há vinte e dois anos, o que nos remete à década de 60 do século XIX, data da provável instalação da sua fábrica de línguas em conserva.

         O estabelecimento preparava e exportava anualmente sessenta e tantas mil línguas.

A fábrica de chapéus de Bamman & Cia.


         Esta fábrica esteve instalada à Rua São Miguel [atual 15 de Novembro] nºs 161 e 163 em prédio próprio.
         À frente, estava a loja e, ao fundo, a fábrica.

         No primeiro compartimento, havia uma máquina de arquear fabricação de H.H. Niebehur & Son, Altona, Alemanha. Esta máquina podia arquear, diariamente, 48 chapéus.
         Nesta máquina, eram empregados dois (2) operários.

         Em frente, ficava uma mesa para arrasar e bastir onde trabalhavam três (3) operários.

         No compartimento anexo, estavam duas (2) caldeiras de fulas [caldeiras de vapor] onde trabalhavam oito operários.

         Seguia-se a oficina da enformação dos chapéus onde trabalhavam três (3) operários.
         Havia uma pequena máquina para lustrar, movida à mão, que podia servir tanto para chapéus de feltro quanto para os chapéus de seda. Com capacidade para lustrar setenta e dois chapéus por dia.

         No mesmo compartimento, estava uma fornalha-caldeira de tintar, uma caldeira a vapor para enformar os chapéus e um fogão para esquentar os ferros, servindo ao mesmo tempo de estufa para os chapéus.
         No pátio, havia um tanque de cimento para a tintura a frio e outro para lavar os chapéus.

         Logo a seguir, estava o depósito de carvão de Coke, de madeira, de lenha e outros materiais.
         Havendo também uma pequena máquina para cortar abas, marca João Hullmann, Hamburg, que era movida à mão e com capacidade para cortar, diariamente, doze dúzias de abas.
         Trabalhavam neste estabelecimento quatorze operários, dos quais um era escravo.
        
          Fora da fábrica, seis costureiras lhes prestavam serviços.

         Na loja, havia três máquinas de costura.
         A fábrica estava estabelecida há vinte e um anos em Pelotas, isto no ano de 1884; mas a denominação de Bamman & Maiaera recente, somente a partir do ano de 1876.

         O Sr. Bamman era natural da Alemanha e o Sr. Maia natural de Portugal.
         Fabricavam eles diversos tipos e feitios de chapéus e, na exposição Brasileiro-Alemã, em Porto Alegre, os produtos de sua fábrica obtiveram uma medalha de prata.

 

A fábrica de chapéus de Cordeiro & Wiener


       A fábrica esteve estabelecida à Praça da Constituição [atual Praça 20 de Setembro] nº 70, em prédio apropriado para tal fim.

         À entrada do portão da fábrica dos Srs. Cordeiro & Wiener, ficava um espaçoso pátio para onde davam as portas de todas as oficinas, o depósito e o escritório, de onde o proprietário podia fiscalizar, de perto, o trabalho.
         Na casa das fornalhas, ficavam duas caldeiras-cilindros, de ferro, que geravam vapor para mover todos os mecanismos da fábrica.

         Um dos cilindros tinha dez metros de comprimento por um metro de diâmetro e, o outro também de mesmo comprimento, mas de diâmetro setenta centímetros.
         Sobre estes cilindros, aproveitava o Sr. Wiener para secar os cloches [espécie de chapéu apertado de senhoras] visto o pátio ser muito pequeno para caber o número de cloches fabricados e que precisavam secar diariamente.

         No mesmo galpão, havia uma excelente ferraria onde eram feitos todos os consertos necessários nas máquinas, para o qual havia pessoal habilitado.
         Na peça contígua, estava o motor de sistema norte-americano, mas fabricado nas oficinas dos Srs. Menning Frères, Bruxelas, de força de 20 cavalos.

         Havia também três (3) bombas movidas a vapor, sendo uma (condensador) para alimentação de água; outra para alimentar as caldeiras aonde ia a água, quase fervendo, o que resultava uma não pequena economia de combustível e, por último a terceira delas, que servia para alimentar o depósito da casa, conduzindo a água a cinquenta metros de altura.
         No pátio, havia um enorme poço, de tijolos, cuja água era aproveitada.

         Do pátio, se ia para a oficina de rebater pelos, onde havia um tambor de madeira, indústria nacional, fabricado na carpintaria da própria fábrica, para misturar o pelo, operação esta que era feita por meio de uns espigões de ferro que o vapor movia em sentido contrário ao impulso dado pela mão ao tambor.
         Uma máquina de rebater pelos, fabricação de Scheneider, Hamburg, com sete compartimentos grandes, onde o pelo mais grosso ficava quase imperceptível e pronto para ser trabalhado.

         Debaixo da máquina, havia uma corrediça [esteira] que conduzia novamente aos cilindros o pelo grosso que caía.

         Tal máquina podia rebater 100 quilos de pelo.

Oficina de bastir e rasoir [retirada de pelos através de aparelho para tal]

         Havia na fábrica uma bastisseuse [máquina de formatar chapéus com bastos de pelo ou lã] que agarrava o pelo e, por diversos mecanismos o conduzia a formar a carapuça. Em anexo havia um depósito de água quente, que molhava a carapuça [parte superior; a armação] quando pronta para segurar o pelo.
         Debaixo do local onde era dado a forma da carapuça, havia um ventilador, sendo o ar deste graduado.

         Esta máquina podia, diariamente, fabricar de trezentos a trezentos e cinquenta chapéus, levando cada um o tempo de meio a três minutos, conforme o peso, e empregava dois operários.
         Com apenas dois operários, a máquina fazia o trabalho de cinquenta pessoas e com muito maior perfeição.

         Daquele local, se passava para o compartimento onde apertavam as carapuças e, para tal função, eram empregados dois operários.
         Nesta oficina, estavam também os oficiais [mão de obra especializada], que trabalhavam em lã, sendo que toda a lã utilizada na fábrica era produzida na Província.

Casa da fula

         Havia quatro (4) fulas, sendo duas para o trabalho de seis (6) operários em cada e as outras duas, menores, para quatro (4) operários em cada.

         Havia também uma máquina de fular que era utilizada para os chapéus mais ordinários [simples, inferiores].

         Enchendo a caixa, em seis horas a máquina fazia o trabalho de 20 operários.

         Duas caldeiras duplas, de cobre, onde eram tintos, a banho-maria, os chapéus e funcionavam com dois operários.

         Próximo ao pátio, existia um suador, que servia para conservar a forma dada aos chapéus.
         Na oficina, existia uma máquina dupla, que funcionava com dois operários, podendo diariamente afinar dezoito dúzias de chapéus enquanto que cada operário não conseguiria afinar mais do que 30 chapéus; sendo que o trabalho destes não seria tão bem feito quanto o da máquina.

         Rente ao piso estava outra máquina para cortar o pau Campeche [uma árvore leguminosa, cuja madeira avermelhada se emprega na tinturaria] podendo, duas pessoas, preparar por dia trinta arrobas de raspas desta madeira.

         O Campeche utilizado era nacional e a máquina era a única existente em toda a Província.
         Dois aquecedores para lã, movidos à mão.

         Fabricavam diariamente 80 chapéus de lã e trezentos e tantos de pelo.

         A fábrica do Sr. Wiener utilizava somente lã nacional, pelo de lebre, coelho, castor e ratão. O pelo de ratão tingia mais facilmente do que qualquer outro pelo.

Oficina de planchadores
         Logo à entrada da oficina, havia dois cloches a vapor para dar suador ao chapéu na enformação.
         Uma prensa para engomar chapéus patent.

         Duas prensas hidráulicas para prensar chapéus de feltro, que também eram únicas na Província, tendo próximo delas um torno movido avapor e por meio de fricção, onde o chapéu era escovado e retirado o excesso de tinta e pelo grosso.

         Um operário por dia, dependendo da qualidade do chapéu, produzia de vinte a vinte e cinco dúzias de chapéus.
         Possuía também um aparelho nacional para chamuscar os pelos.

         A um canto da oficina estavam duas fornalhas para aquentar ferros de engomar, podendo ao mesmo tempo servir de estufa para os chapéus.
         Trabalhava ali 24 operários.

         Passava-se dali para os depósitos, sendo o primeiro deles o dos chapéus prontos para a exportação.
         Ao redor deste depósito, havia uma estufa que conservava o ar em temperatura regular, evitando a umidade.

         A seguir vinha o depósito de forros, metins, cetins, chapéus ainda não terminados, tendo ao redor grandes armários e ao centro do depósito diversas prateleiras.
         Próximo, ficava o depósito da lã, pelos, pau Campeche e diversos produtos químicos.

Oficina de cartonagem e formas

         Naquele local, ficava um operário que produzia 400 caixas por mês.
         Havia uma prensa para imprimir a logomarca da fábrica nos forros e outra para fazer folhos [tiras para abas dos chapéus].

         Outro operário fabricava as formas de chapéus, evitando assim que fosse mandado fazer fora do estabelecimento.
         Aproveitavam ainda as peles de ratão,que, depois de extraído o pelo, era matéria prima para fazer cola.

         Havia também na fábrica uma oficina de costureiras que, por maior que tivesse sido o esforço do Sr. Wiener para que elas trabalhassem naquele local, preferiam fazê-lo em suas próprias casas.
         A fábrica empregava sessenta operários, entre homens e crianças e vinte e duas costureiras.

         As vendas anuais da fábrica giravam em torno de duzentos contos ou mais.
         Nesta fábrica, nada se desperdiçava, pois o pelo e a lã que não serviam para o fabrico dos chapéus era vendido aos colchoeiros.

         O Sr. Wiener era natural da Alemanha e vivia no Brasil desde o ano de 1870. Era ele, segundo a imprensa da época, um cavalheiro amável e atencioso e um industrial bem quisto não só pela lisura em seus compromissos como pela sua maneira austera de proceder.

 

        

Fonte de consulta e imagens: Bibliotheca Pública Pelotense - CDOV

Revisão do texto: Jonas Tenfen        

Tratamento de imagem: Bruna Detoni

          

 

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