sexta-feira, 13 de novembro de 2015

A charqueada do comendador Heleodoro de Azevedo Souza

                   
                                                                                     A.F.Monquelat


        
         O estabelecimento do Sr. Heleodoro de Azevedo Souza tido na década de 80 como único em seu gênero, pela limpeza e asseio, estava situado à margem esquerda do Canal São Gonçalo, no porto da cidade de Pelotas.
         À esquerda da entrada, estava a casa de moradia do Sr. Heleodoro, onde “se encontravam todas as comodidades”.
       À frente, estava a cancha da matança onde trabalhavam vinte e cinco carneadores, todos sob a supervisão e fiscalização do proprietário da charqueada.
         Qualquer rês abatida que, por uma eventualidade qualquer, se sujasse, era imediatamente lavada, bem como o local onde o fato ocorrera, de forma que a próxima rês encontraria tudo limpo.
         Ao lado, estava o galpão de charquear, com ganchos para duzentas reses.
         O galpão era assoalhado e, ali mesmo, estavam as mesas para a salga, em numero de três, trabalhando em cada mesa duas pessoas.
         Havia também, no mesmo galpão, um depósito de sal fino que comportava quatro mil alqueires. Ainda naquele local se faziam as pilhas de carne, costumando ser em número de quinze.
         A um canto estavam dois bons tanques de laje e cimento, para as costelas.
         Por encanamento, era aproveitada a salmoura, que ia ter ao tanque de couros, na barraca.
         No pátio, em frente, estavam os varais em número suficiente para a carne de mil e duzentas reses.
         Entre o galpão de charquear e a barraca, havia uma grande eira, de cimento, que servia para estender ao sol o sal a fim de secá-lo.
         À beira do Canal, estavam dois tanques grandes, de cimento, para a lavagem do sebo e tripas, tendo ao pé uma bomba aspirante, movida a mão, e uma torneira com encanamento da Companhia Hydraulica Pelotense.
         A barraca era o local onde faziam o descarne e, ao pé, estava o tanque de salmoura para duzentos couros, podendo esta barraca comportar cinco mil couros.
         Tinha esta charqueada três trapiches, sendo um para o embarque dos couros, outro para carnes e gorduras, e outro para o desembarque do sal.
         Na graxeira, havia um bom cilindro, de força de trinta cavalos dinâmicos, indústria nacional, fabricado na Costa, na oficina dos sucessores de Vidot.
         Em redor, estavam três tinas para graxa e uma para o sebo, comportando cada a gordura de duzentas reses.
         Em oito tinas, volantes, as gorduras esfriavam.
         Fora estavam quatro tanques de tijolo, que serviam para sangrar as tinas e como depósito de resíduos.
         O cilindro era suprido por água da Companhia Hydraulica Pelotense e, ao pé, havia ainda uma bomba aspirante, indústria nacional, também fabricada na sucessão Vidot, localizada na Costa.
         Perto dos tanques para resíduos, havia um poço de vinte palmos de profundidade.
         Ao pé das tinas, havia um compartimento, que servia de depósito de pipas vazias.
         No depósito de graxa, havia duas fornalhas-caldeiras, de ferro, comportando cada mil e duzentos quilos de graxa.
         Ao centro, havia outra caldeira de ferro para esfriar a graxa e embexigar.
         Em frente, estava o depósito de cinza, que servia também de depósito de barricas e cascos.
         No pátio, tinha oito pilhas de madeira para o charque, situadas à beira do Canal São Gonçalo.
         Nesta charqueada, os rondadores eram escolhidos entre os próprios escravos, sendo “tal distinção” determinada pelo charqueador. No ano de 1884, era seis o número de rondadores que a charqueada possuía.

      
  Em compartimentos separados, estava a casa de atafona para moer sal, tendo de cada lado um depósito de sal, sendo um para cinco mil alqueires e outro para vinte mil. Havia ainda, em outros compartimentos, um depósito para miudezas, cozinha, senzalas, hospital, um bom depósito para lenha, podendo este comportar a lenha de três barcadas, e um outro para mantimentos.

         Tinha uma boa casa para banho, com todas “as comodidades”, sendo o banheiro bem grande e todo de azulejos, também havia chuveiro.
         À direita da entrada, estava a casa do capataz.
         Trabalhavam nesta charqueada setenta pessoas, sendo vinte livres e cinquenta escravos.
         Tinham quatro carroças para o serviço, puxadas por animais cavalares, quatro carroças de mão e trinta carrinhos.
         A mangueira era de madeira e nela podiam caber mil e duzentos animais.
         Todo o serviço de cancha era feito com animais cavalares.
         O trabalho de matança e charquear eram sempre feitos de dia, o que era considerado uma ideia digna de imitação “pelos salutares resultados que apresenta”.
         Esta charqueada era a única que tinha encanamento da Companhia Hydraulica Pelotense.
         Todos os galpões eram assoalhados e “faz gosto ver a limpeza, quer no assoalho quer nas paredes”.
         Podia dizer-se, segundo palavras de um visitante, que uma senhora poderia visitar aquele estabelecimento levando calçados brancos, que não os mancharia com uma só gota de sangue.
         Em todo o serviço, só era desperdiçado o sangue dos animais abatidos, tudo o mais era aproveitado para diferentes fins.
         Possuía o Sr. Heleodoro quinze animais vacuns, de raça, e cinco cavalares.
         Tinha cinco potreiros grandes, dois menores e uma horta grande.
       Todo o serviço era fiscalizado pelo próprio Sr. Heleodoro de Azevedo, coadjuvado por seus filhos.
   Este estabelecimento industrial estava situado ao pé da cidade, no porto de desembarque e ponto terminal da linha de bondes, sendo por isso visitado diariamente por muitas pessoas.
         Aos 14 dias do mês de janeiro de 1886, um negro, escravo do Sr. Heleodoro de Azevedo Souza Filho, que fugira da charqueada, foi ferido com um tiro de bala, que lhe disparou um indivíduo que andava em sua procura para capturá-lo, segundo ordens do charqueador.
         O Sr. Heleodoro de Azevedo Souza faleceu na madrugada de 3 de agosto de 1887, em Pelotas.

        
        
Fonte de consulta: Bibliotheca Pública Pelotense - CDOV
Revisão do texto: Jonas Tenfen        
Tratamento de imagem: Bruna Detoni


Nenhum comentário:

Postar um comentário