sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

O pecado (parte 2)*





Baile de máscaras na Rua Paysandu


Até janeiro deste ano não encontramos, na imprensa de Pelotas, indícios ou registros de casas de prostituição no sentido mais amplo e que designasse uma casa de meretrizes. O que encontramos, são notícias curtas relacionadas a fato ou fatos ocorridos em casa de uma ou outra prostituta, geralmente provocados por homens, como foi o caso do alferes Antero P. de Moraes, que foi recolhido ao estado maior do quartel da polícia, no dia 18 de janeiro de 1877, por ter provocado distúrbios em casa de uma “meretriz moradora à Rua Paysandu [atual Barão de Santa Tecla]”.
Naquele mesmo dia, o redator do jornal Paiz pede à polícia, que “ao menos por esta vez” o atendesse; pois, até então existia uma completa indiferença para, segundo ele, as perniciosas reuniões cognominadas por bailes masques [bailes de máscaras]; pois, em tais reuniões se encontravam “mulheres enfermas do corpo e da alma”, além de indivíduos sem profissão nem moralidade, cujo único desejo era a saciação de vícios torpes e tendo por norte a devassidão e a orgia.
Ali, segundo o jornalista, contemplava-se a bacanal infrene, que tudo desrespeitava e tudo apodrecia e era onde a prostituição oferecia o braço à ociosidade, e bailavam em “can-can [dança francesa, que por largo tempo foi considerada imoral e indecente, sendo por isto proibida pela polícia] repugnante e licencioso”.
Entendia ainda o jornalista que aquelas reuniões eram o chamariz de incautas vítimas, que ali iam pagar o seu tributo, e a perdição de jovens inexperientes; portanto, que acabassem, pois, com semelhante escola, que serviria apenas para “dar uma triste cópia dos nossos costumes”, e que por isso lhes fossem negadas terminantemente as respectivas licenças.
Dias depois, voltaria o jornalista a denunciar os “celebremente afamados bailes masques”, que continuavam a divertir os amantes das boas reuniões, dizendo ter acontecido no domingo à noite em certa casa da Rua do Imperador [atual Felix da Cunha] um destes, e que a algazarra, a desordem e a confusão eram tamanhas, que “a grande distância se ouvia o eco infernal”; também comunicava que a vizinhança vivia atordoada, privada do sono e queixando-se amargamente de semelhante escândalo e que, tendo em vista que a autoridade policial não apenas ignorava as suas reclamações, como era digno de menção o fato de terem tomado parte na folia, “praças da força policial”. O pior de tudo e indignação maior do jornalista: “A polícia bailando de vis-à-vis com negros cativos!...”.
Encerrando sua indignação chamava a atenção para aquele reprovável procedimento – já que o delegado de polícia “tudo permite” do capitão Delfino, no qual reconhecia um oficial “brioso e fiel cumpridor dos seus deveres”.



Suicídio da meretriz Generosa


A meretriz Generosa dos Santos Corrêa, de 40 e tantos anos de idade, residente à Rua General Vitorino [Anchieta], pôs termo a seus dias precipitando-se ao Arroio Santa Bárbara. Esta por mais uma vez, impelida pelos desgostos, quem sabe as dificuldades ou “levada pelo arrependimento da desgraçada vida a que se entregara”, tentou dar fim a existência; mas, em vão. Finalmente, alcançara seu intento.
O seu cadáver foi encontrado próximo à ponte de madeira, e dali conduzido ao Necrotério, onde procederam ao auto de corpo de delito, devendo, dia 16 de maio de 1877, ser dado à sepultura.
O subdelegado de polícia em exercício, Sr. José Manoel Afonso, acompanhado do escrivão Sr. Francisco de Paula Nunes, deu as providências que o caso exigia.
À notícia do suicídio de Generosa acrescentou o jornalista que, em outro tempo, quando no vigor da mocidade e dotada de atrativos, era Generosa festejada e os seus admiradores a supriam de todas as necessidades, ela se julgava feliz e que essa felicidade não acabaria.
Mas, à medida que os anos se passavam, diminuía o número de adoradores, as faltas começaram a acontecer, até que a miséria, com todos os seus horrores, invadiu-lhe o já não tão frequentado domicílio, outrora tão disputado.

Um cáften na mira da polícia

Foi dia 10 de outubro de 1878, à repartição da polícia, “uma dessas infelizes filhas do vício”, chamada Rosa de Tal, mais conhecida por Henriqueta, a espanholita, queixar-se de que era constantemente espancada pelo indivíduo Luiz Gonzalez Garcia, com quem a longo tempo vivia amasiada.
Sendo Garcia chamado àquela repartição, foi pela autoridade advertido e comprometeu-se a satisfazer a vontade da ofendida, que desejava ver-se livre dele, que, além dos maus tratos que lhe dava, vivia à sua custa.
A autoridade não procedeu com mais energia, por falta de provas, porém, deixou o acusado sob vigilância porque, além de tudo, suspeitava ser ele um cáften.


Taverna ou lupanar?


Na Rua Sete de Abril [atual D. Pedro II], embaixo de um sobrado azul, existia uma taverna que não se sujeitava à postura municipal – que ordenava hora certa e determinada para o fechamento das casas de negócios à noite.
Dizia o jornalista que ali se davam cenas de lupanares, às horas mortas, bailes chinfrinanos [bailes com desordem, algazarra] e barulho.
Além de chamar a atenção dos fiscais para o que acontecia na tal taverna, pedia que tomassem providências também para um cão morto, próximo ao mesmo sobrado azul, que estava em estado de putrefação e ameaçava a saúde do povo.

Foi ou não a meretriz Geraldina quem se feriu?

O Sr. subdelegado do 2º distrito, ao tomar conhecimento de que a meretriz Geraldina tinha recebido um ferimento sobre o ventre, se fez acompanhar do Dr. Vitor de Brito que lhe aplicou os primeiros curativos, fazendo a seguir o auto de corpo de delito, na intenção se fora ou não um crime, visto a meretriz ter dito que ela mesma se ferira.
A autoridade procederia na investigação; pois, do exame médico, resultaria a certeza de ter se dado um crime, “que a infeliz intenta desculpar”.

Conflito e ferimentos na casa da Constança


Dois sargentos e dois soldados de linha, dia 8 de abril de 1879, à noite, quebraram as vidraças e tentaram arrombar a casa da Rua 3 de Fevereiro [Major Cícero], em que residia a meretriz de nome Constança.
Aos gritos de socorro dados por esta, acudiram vários praças do destacamento policial, comandados pelo sargento José Maria, e intimaram os agressores a retirarem-se.
Como resposta, estes pegaram os rifles e atacaram a polícia que, em defesa, teve de fazer uso das armas, resultando ficar ferido um cadete, dois sargentos de linha e um dos policiais; os outros dois soldados, à vista da resistência que a polícia opunha, fugiram.
O jornalista comentava que tal fato atestava a falta de moralidade de seus autores.
Informava ele também que o Sr. capitão Campelo, comandante do destacamento de linha, telefonou no dia seguinte para o Rio Grande relatando o corrido ao Sr. comandante da guarnição, pedindo que os praças desordeiros fossem substituídos.


Continua...


____________________________________________________________ * Extraído do livro, ainda inédito, A princesa do vício e do pecado
Revisão do texto: Jonas Tenfen

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